24 janeiro, 2009

An almost empty canvas on The Recognitions

Eu enrolei bastante antes de escrever este post porque o livro tem quase mil páginas, e, notando isso de que vou falar ainda no começo, não podia dar como certo que continuaria assim. Agora, 600 páginas depois, acho que posso dizer mais ou menos o que achei mais interessante em The Recognitions.

O livro é um grande amontoado de quadros que contam uma história. É como uma Via Sacra, quase. A diferença é que o elemento principal da Via Sacra - Jesus, para os que não sabem - aparece como elemento central em todos os quadros, e a história é contada de forma bastante uniforme e centralizada. The Recognitions é um amontoado de quadros que têm, em geral, ligação apenas indireta com o personagem que, originalmente, parecia ser o principal.

Tanto que às vezes esquecemos que ele existe, e de repente ele é citado rapidamente, sem seu nome (Wyatt) mencionado, de forma que apenas reconhecemos (desculpa) o personagem ali. Às vezes esse reconhecimento é bem distante, e aparentemente invisível, até que você seja esperto o bastante para captá-lo. Com o passar das páginas a gente fica melhor nessa busca, e o funcionamento da coisa fica mais fácil de entender, e a gente começa a buscar no começo do livro coisas que eram menos claras, coisas que eram mais vazias (e começa a se interessar pelas obras que ele cita, esse erudito filho da mãe, e faz a gente usar A Anunciação de Jan van Eyck como papel de parede, porque tem o azul mais bonito que alguém já viu).

Claro, isso tudo são as observações formais sobre o livro, que do conteúdo nada falarei pra não simplificar demais algo que eu não saberia expressar sem estragar completamente. Posso adiantar, entretanto, que os diálogos são tão geniais que me fazem pensar se algum dia o meio artsy falou diferente ou se o Brasil é que é tão atrasado que só conseguiu os cacoetes americanos 50 anos depois. Todos o vícios e a pompa de conversas apenas semi-informadas que se empolam e convoluem (existe convoluem?) para fazer desaparecer qualquer rastro de desinformação nas muitas camadas de viadagem (no bom sentido, que não é bom de verdade, mas serve como expressão para diferenciar da viadagem física) que quase todos os personagens fazem questão de incluir.

Aí acaba o diálogo e o narrador fala, uma linguagem direta - apesar de altamente referencial (mitologia grega, mithraísmo e outros milhões de coisos interessantes) - e às vezes lenta e sempre descritiva que monta o quadro, que se conclui alguns minutos depois, mas que deixa a certeza, por meio do contraste, de que aqueles personagens são tão ridículos que é desnecessária até mesmo uma crítica mais ácida pra identificar o número de besteiras que eles falam.

Antes que vocês leiam, deixem-me ordenar que vocês simpatizem mais com o Stanley, o Wyatt e o avô do Wyatt, The Town Carpenter, que com os outros personagens, e que quase gostem da Esme, apesar de eu não saber se Gaddis queria isso pra ela. E que concordem com toda a crítica pós-moderna de Gaddis ao modernismo, porque o pós-modernismo de Gaddis é pós-moderno só na forma, e ele ama tanto os clássicos que fica nos obrigando a nos interessar mais por eles, e a lê-los (ou ler sobre eles, quando ler os livros em pessoa tomaria muito do tempo que pretendemos dedicar a The Recognitions).

Além disso, ignore as aliterações. Eu ignoro todas as aliterações de todos os autores em prosa, porque aliteração não é bonito em prosa, é um recurso cansativo, apenas, que costuma dificultar a leitura por exigir que se escolham palavras menos precisas pra manter o ritmo. Às vezes Gaddis até consegue usar a aliteração direitinho, porque ela deveria estar ali, e não porque ela é aliteração, e a leitura flui apesar dela, e flui ritmada, mas às vezes Gaddis atrapalha a leitura do próprio livro (isso acontece em um capítulo lá pela página 400, se não me engano, e dura apenas umas 20 páginas, mas cansa mais que as 300 primeiras páginas, que você lê nos três primeiros dias). Aí agora eu vou dormir, que tenho mais o que fazer que conversar com todas essas pessoas que entram sempre aqui e comentam, essas muitas pessoas que adoram meu blog.

20 janeiro, 2009

Lula e a imprensa

Eu demorei pra escrever porque achava que alguém teria a excelente idéia de escrever por mim, mas peraí: o presidente fala a primeira coisa sensata desde que assumiu como deputado pela primeira vez, talvez de toda a vida, e o que me aparece? Só idiotas achando "um absurdo" que o "apedeuta" do "preZidente Mulla" não leia nada da nossa imprensa (SAP: "um absurdo que ele não se importe com todas as críticas retardadas que faço a ele todos os dias, 48 vezes por dia, e compilo num artigo sem graça).

Bom, eu fiquei extremamente feliz com isso, porque 1) ele não vai ler nada que eu publicar e 2) pelo menos ele tem noção de como a mistura de política com imprensa é nociva à população (ou talvez ele seja só preguiçoso, mas eu tenho essa noção, e a idéia de Lula lendo um texto meu no banheiro dá azia em mim, vou te contar).

Porque, francamente, querer ser lido pelo Lula é mais mau gosto do que suportaria meu jovem cérebro, acostumado a Johnny Cash, Catherine Zeta-Jones e Nutella. E porque, também francamente, pois sou sincero, presidente que lê os jornais tende com mais intensidade a censurá-los quando - por acidente - eles falam alguma verdade (afinal, ele é culto, bem-informado e, pior, tem poder).

Um presidente que não acompanha a imprensa é, necessariamente, melhor que um que lê a Folha, o Estadão e O Globo todos os dias, além de todas as matérias da Veja, IstoÉ, Carta Capital e Época. Eu, por exemplo, não leio a Folha, o Estadão ou O Globo, nem qualquer uma das revistas que o Lula também não lê, e me acho muito mais útil que o Reinaldo Azevedo, se é que o Reinaldo Azevedo falou alguma coisa sobre isso (apenas suponho, não pensem que eu abri o blog dele, céus!). E eu estou comendo Nutella, reparem (QED minha importância superior).

Além disso, mesmo se Lula não fosse um completo retardado, e se conhecer algo não fosse o requisito essencial para julgá-lo (e sabemos que o presidente não deve julgar a imprensa, pombas), ainda assim, eu prefiro ter um presidente muito preocupado com, digamos, A Peste, que se espalhou tão terrivelmente que destruiu Londres em 1665, conta Defoe (ou Pepys, que ele pode ter preferências diferentes das minhas), que com a dengue, que matou meia dúzia de bebês sem higiene ano passado. Com a morte de Luís XVI - "Coitado!" - que com um novo seqüestro das FARCs.

E não é somente uma preferência estética, que não sou assim tão superficial. É uma preferência política. Quanto mais alienados os políticos, mas feliz o país em que esses políticos governam. É só ver os Estados Unidos. Toda vez que alguém muito preocupado com a atualidade, o terrorismo, a distribuição de renda assume, chove chumbo, surge crise, gente se mata, o preço do Nutella sobe etc.

Sempre que um presidente lê uma notícia sobre, digamos, saúde pública, além de surgir uma nova epidemia (graças em grande parte às medidas emergenciais, como, it's a long shot I take, proibir privadas com fundo quadrado), o dinheiro pra contê-la (e subsidiar essas privadas, fabricadas pelo sobrinho do senador que propôs a medida) vai sair da educação e PIMBA!, os problemas se multiplicam. É batata. Só não vê quem não quer. E quem está com os olhos vidrados nas páginas dos jornais.

P.s.: quem não fica feliz em saber que, pelo menos, os dedos do presidente não estão sujos de tinta? Que talvez - talvez! - ele tenha uma mão asseada, com a qual ele vai apertar sua mão na próxima campanha (porque ele vai). Ou você prefere apertar a mão de um presidente intelectual, todo asseadinho, mas que vai manchar as costas da sua camisa quando te cumprimentar com um tapinha gentil?

P.p.s.: E o presidente intelectual também tem resquícios de tinta de jornal debaixo das unhas, que vão impedir você de comer quando ele sentar à sua frente na mesa e pegar a coxa de galinha com as duas mãos e cravar-lhe os dentes, faminto (não que ele vá, Deus te proteja, mas eu gosto de usar essas situações de rotina pra provar que eu estou certo). Além de que, como diz minha mãe, minha onisciente mãe, "é pelas mãos e pelos pés que se julga um homem".

Quê mais? Tenho que explicar que um presidente intelectual, geralmente, não é um verdadeiro intelectual. É apenas reconhecido como intelectual, como qualquer pessoa que tenha lido mais que três livros e acompanhe todos os jornais é sempre. Porque intelectual de verdade não gosta de jornais. O bom gosto não permitiria que ele lesse essas matérias vazias dos nossos jornalistas, e, principalmente, que se envolvesse com política e se candidatasse.

07 janeiro, 2009

Recém-formado

Decidiu durante a festa seguir a mais longa das carreiras. Morreu de overdose.

01 janeiro, 2009

Feliz ano novo

Estava lendo The Recognitions aqui e tive uma idéia pra um romance que eu sei que eu seria incapaz de completar, então deixa eu sugerir aqui pro primeiro que quiser aproveitar, porque sou bom e gentil, e porque eu só cobro 10% do lucro.

Basicamente é o seguinte: o romance deve ter uns 500 milhões de personagens, cada um de uma religião diferente, embora não se diga nada sobre as religiões assim, diretamente. Só insinuações. "Idólatra", "Ave Maria" ou "Santa Montanha" seriam as pistas deixadas pelo protestante, pelo católico e pelo xintoísta, por exemplo.

Enfim, 500 milhões de personagens porque, reparem, todas as religiões do mundo precisam estar representadas, e por isso eu seria incapaz de escrever isso. Daí, eventualmente, todos morreriam, e todos iriam pro céu. Cada um pro seu céu, a maravilha reservada pra cada um deles. Então eles ficariam no Paraíso, todos achando que Deus tinha dado a eles o privilégio de ir ao Paraíso, justamente porque eles não sabiam que o Paraíso não é só um, é como um monte de países sem fronteiras, e porque eles não sabiam que Deus era bom.

Daí eles começariam a achar ridículo que tenham existido tantos idiotas na Terra que achavam que iam pro Paraíso, quando na verdade só existia o Paraíso judeu, cheio de carneiros e toneladas de sal kosher, ou o hindu, cheio de vaquinhas, ou o muçulmano, cheio de virgens. Ficam tão metidos que começam a irritar Deus, que manda todos pro inferno. O inferno é um só, por outro lado. Todas as religiões se misturam por lá, e talvez por isso.

Quando chegam, ficam tão melancólicos por deixar o Paraíso que são incapazes de conversar com o pessoal das outras religiões, então eles passam a eternidade sem poder se redimir, sempre achando que o Paraíso era pra eles, e o resto não conhecia nada melhor que a Terra - por isso não sofria tanto no inferno. Ninguém se salva. Fim.