Ah, as conseqüências! Se não fosse por ligar tanto pra elas, muita coisa estaria melhor no Brasil. Em Recife, por exemplo, um gari achou uma maleta com dinheiro - uns mil reais aí. Quarenta e cinco, acho - na prefeitura, ou pelo menos foi o que entendi do professor falando, e disse que entregou pro segurança da prefeitura, que deu um jeito de sumir com a maleta. A pergunta a se fazer é...
Errado, meu desatento leitor. Não interessa quem está com a maleta, quem fez o quê com ela. Não importa nada depois do encontro do gari com a maleta. A pergunta apropriada é "O que uma maleta com dinheiro fazia na prefeitura?" ou "Quem levou a maleta pra lá?"
Lembremos que o ambiente de que falamos é uma prefeitura, por onde circulam, naturalmente, políticos. O que o honrado segurança fez quando resolveu gastar por si o dinheiro da maleta - supondo que foi isso o que ele fez - foi evitar a conclusão de um poderoso esquema de propina. Mas o escândalo não se instaurou. Ninguém liga pro passado, as pessoas não gostam de investigar causas, ocupadas que estão com as decisões a se tomar - prende o guarda; bate; tortura; bandido; dinheiro público, devolve!; eu quero o meu.
Não considero crime o que o segurança fez porque eu não ia aproveitar nada mesmo do dinheiro, que seria gasto com prostitutas de luxo ou viagens à Malásia, para organizar esquemas internacionais de corrupção. Se não posso usar o dinheiro público, prefiro que um segurança use. Me sinto mais tranqüilo e seguro de perceber que, em vez de estar dando ainda mais dinheiro pra quem já me rouba sempre, tenho um bandido menor, um ladrão de galinhas, interessado nos meus bolsos - antes um trombadinha que a máfia.
Mas claro, existe a possibilidade de que uma maleta cheia de dinheiro escondida num banheiro da prefeitura fosse completamente lícita, esquecida lá por algum distraído que não liga o bastante pra dinheiro suficiente pra comprar um pequeno apartamento ou dar de entrada numa casa em bairro nobre. E digo isso, claro, rindo de tão ridícula que é essa hipótese, como se dinheiro honesto de alguma espécie pudesse entrar num órgão público sem sair fedendo ou se sujar logo na entrada.
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