07 março, 2010

Mais Hokuto no Ken

Eu, depois de ver uns quantos episódios de Hokuto no Ken - uns 20 e poucos, só, interrompidos por uma série de divagações meio tontas e desnecessárias, como rever uns episódios de Pokémon (14, acho, até o episódio do Bill e do Dragonite gigante e toda a obsessão besta do Bill pelos Dragonites, que nem são raros nem nada - o Lance parecendo ter uma coleção deles, na verdade, que nem a coleção de Taurus do Ash ou do Gary), jogar Final Fantasy IV pela primeira vez (e zerar em um jogo de quarenta e poucas horas e com o arrependimento de não haver levado a turma pro level 99, todo mundo entre 60 e 65), ler um LIVRO SECRETO que tô quase terminando, ler Tirant lo Blanc, que tô longe do fim, começar a reler Dom Quixote (com olhos de estudante, observando o mundo todo ironicão que Cervantes coloca como uma coisa toda proposital, como se nenhuma palavra fosse fruto de acaso ou de destempero momentâneo do autor, porque assim parecem gostar as professoras), ver filmes da Disney e do Studio Ghibli, comer muitos bolinhos de chuva (duas vezes), jogar Campo Minado com pequenas obsessões com porcentagens de vitórias, zerando as estatísticas sempre que caíam abaixo de 75% ou passavam de 80 depois do jogo 100, ler Hunter x Hunter até chegar no ponto da publicação atual, me dando o compromisso de acompanhar agora três mangas semanalmente, começar a ler também Berserk (tão macho quanto Hokuto no Ken, apesar da viadagem do elfo tentar dizer algo desnecessário, lembrando que o mundo não é assim tão macho - comecei a ler o manga também.

Acabo de começar, na verdade, ainda pela metade do primeiro capítulo me interrompi pra escrever esse post com algumas coisas sobre o que o pessoal aqui na Espanha chama erradamente de "ciencia ficción", que chamamos no Brasil de ficção científica de forma tão acertada que dá vontade de abraçar o idioma (até eu lembrar que o Kenshiro jamais abraçaria idioma nenhum e me recompor).

As coisas na verdade são só duas, bem simples e bestas e gerais e que todo mundo sabe, porque estudo jornalismo e minha função principal na faculdade é chegar sempre por último pra informar a galera que não se importa o suficiente pra se mover atrás de informação com informações atrasadas que vão fazê-los pensar "uau, que mundo, né?" e acreditar que o twitter é uma revolução digital, essas baboseiras que todo jornalista divulga por amor à arte de mal-informar:

A primeira é relativa às datas escolhidas. Hokuto no Ken nem se dá o trabalho de disfarçar a proximidade da coisa toda e destrói o mundo com bombas atômicas no ano de 2010. Um monte de ficção científica dos anos 70 se passava nos anos 2000, nessa Terra de carros voadores e rebeliões cibernéticas de robôs muito mais inteligentes que o homem que decidem escravizar a humanidade, pá.

O que me passa pela cabeça é que, se eu fosse escrever um livro de ficção científica, eu o faria de forma a ser possível sua apreciação por mais que a minha geração ou a minha geração e a dos meus filhos, como é o caso. Faria um futuro pós-apocalíptico ambientado num futuro realmente pós-apocalíptico, que pode ser 2013, se os Maias (Incas? Astecas?) estiverem certo, ou 25700231, quando na realidade o sol já vai ter se apagado há algumas décadas, mas não no livro.

Sei que essa proximidade da data dá toda uma sensação tangencial à coisa toda pra quem lê pioneiramente, que fica todo apreensivo com a proximidade de tudo aquilo que está ali, tal. Essa falsa ligação tão real que o tempo faz entre o cenário da história e o mundo aqui nosso que é necessária, até, pro gênero ser levado a sério. Mas o que me importa mesmo é como essa imagem toda se desmonta em inocência, em bobagens, quando passa um só dia do prazo estabelecido lá na história, um tipo de alívio de descobrir que a bomba-relógio não estava carregada, que foi um trote, né?, que acaba até mesmo desligando os sensores morais que a ficção científica está sempre querendo acender (esta uma das razões por eu achar tão chato o gênero todo, essa idéia fixa de que se não seguirmos o roteiro ali vamos virar um monte de macacos olhando um monolito numa cena de quarenta e oito horas de massacre de cinema, ou não era assim o 2001? Não lembro, dormi o tempo todo - pior filme de todos os tempos).

Aceito que posicionar a história aqui do lado, pra que meu filho possa ver, ou mesmo o eu velhinho, já de bengala e dentadura e vergonha de sorrir por desconfiar do poder real do Ultra Corega Adesivo, seja interessante pra acionar todos eesses botões morais com mais força, ligar uma espécie de ALERTA VERMELHO, mas também, quando passa, falha tanto em valer de alguma coisa, fica com aquela cara triste de piada velha, de mentira, de Pedro e o Lobo, que, por mais que um dia possa acontecer, ninguém vai nem acreditar, porque você já mentiu uma vez, autor de Sci-fi.

Daí que uma história em 25700231 ia falhar na ativação do ALERTA VERMELHO, mas funcionaria como um alerta-outra-cor-menos-importante por muito mais tempo, tipo um download em conexão discada, lentinho, mas duradouro, funcionando por milhares de décadas, minha linhagem já extinta - ou quase, se eu tiver tantos filhos quantos gostaria e todos me derem tantos netos quanto eu gostaria etc. - até lá. E com a vantagem de, quando se aproximar tudo, quando chegar, sei lá, 25700171, o alerta vermelho ainda vai ativar, já que a única ligação do futuro sci-fi com a realidade costuma pesar na data, mesmo.

A segunda coisa é que o mote principal de Hokuto no Ken parece ser "Baratas e gente má sobrevivem à radiação nuclear". E gente má usa aquelas tatuagens e motos, aqueles cortes de cabelo doidões, uns moicanos muito fera, muito de quem anda em ônibus lotado pra se esfregar na menina triste sentada ouvindo o MP3 voltando da escola que não tem como encolher mais o ombro do que já está. O povo bom é todo recolhidinho, acuado, porque deles só sobrevivem os mais fracos, os mais desanimados, mas dos malvados sempre tem uma carrada por aí, em gangues numeradas e muito bem organizadas e motos maneiras (a única coisa, pra mim, que caracteriza melhor um vilão que uma moto toda potentona de umas doze mil cilindradas é uma camisa/casaco/sobretudo de gola alta, mas cada nunca muito misturados pra não destoar: moto é vilão de gangue, gola alta é vilão de castelo, é um barão que é vampiro, um conde que maltrata criancinhas com aulas de Moral e Cívica e senhoras gentis e delicadas que colhem margaridas nos parques com exibição de filmes do Kubrick).
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(Um dos episódios de Hokuto no Ken me deu até uma idéia pra um conto sobre uma cidade dominada por duas gangues em concorrência direta pelas propinas dos moradores, que mantêm um equilíbrio delicado entre ameaças de mudanças pros bairros da outra gangue e a sobrevivência a despeito de estarem sob o do jugo dessas gangues, uma coisa muito panfletária, mesmo, tipo os contos do FDR pro OrdemLivre, que nem deixam de ser legais por serem panfletos, na verdade, mas a preguiça me impede completamente de escrever sobre esse povo aí, e essas gangues de gente com moicano e motos cavalonas).
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Seria este o post mais desarticulado da história deste blog? Difícil precisar, mas como são quatro e meia da madrugada aqui em Sevilha, e como eu nunca escrevi assim tão tarde, é provável que sim, seja.

2 comentários:

Gustavo disse...

O post mais nerd da minha história, também.

Alê disse...

A vida é feita de moicanos fera e motonas maneiras. Obrigado pelo post. E nem achei tão nerd assim, ó.