Às vezes me impressiono como há pessoas capazes de falar de forma interessante sobre coisas absolutamente banais, como o pudim de leite que comeu em alguma padaria às três da manhã, que estava mais brilhante que uma manhã de verão em alguma ilha grega, mais gostoso que a Salma Hayek, coisas assim, só que bem descritas. Eu me sinto incapaz disso e, portanto, vivo em busca de grandes histórias inéditas que jamais encontro - porque as grandes histórias não exigem um estilo grandioso, apenas uma forma relativamente bem elaborada e apropriada para o conteúdo.
Mas o que me impressiona ainda mais é que muitas pessoas não notem ser incapazes de transformar histórias medíocres em grande atração, e o Brasil está acostumado a não notar essa incapacidade naqueles que tentam fazê-lo. Olga, por exemplo, poderia ser um bom filme. Mesmo. A história não é das piores, mas foi contada, talvez, da pior forma possível.
Defendo aqui Olga Benário, não pelas suas idéias nem pelo que pensava do mundo, mas pela qualidade de sua história - teve uma filha enquanto estava presa, foi levada aos campos de concentração, torturada e tal. E transformaram a história dela em um espetáculo cômico. Chego a gostar do filme por ser tão patético, como há pessoas que se afeiçoam a animaizinhos por serem frágeis.
Nunca na história do cinema aliaram-se tantos clichês: Olga tem firmeza de caráter, ama um único homem durante a vida, e, enquanto está feliz, toda a natureza a acompanha. Parece um pouco com aqueles escritores, acho que românticos, brasileiros, que faziam toda a Terra sorrir quando o protagonista estava bem, mas que, quando ele ficava triste, chovia, anoitecia - e as noites duravam décadas, páginas e mais páginas de noite eterna. Olga é presa numa noite chuvosa. E Olga é líder: ela tenta interferir na tortura que fazem nas suas colegas de prisão, tenta conciliar todas contra o nazismo.
Os nazistas não são humanos. São nazistas. Todos têm olhar mais que severo, duro, seco e mau, muito, muito mau. Eles não falam sem antes chicotear, eles não pedem duas vezes. A carcereira de Olga no Brasil, parece-me, era incapaz de permitir que ela amamentasse sua filha até ela se saciar um dia sequer, porque ela era má. Um robô programado para impedir crianças de ser devidamente amamentadas. E quando tiram definitivamente a menina de Olga e ela vai ser deportada, Olga se agarra às grades de sua cela e grita "Assassinos! Assassinos!" enquanto cai chorando com o sapatinho de sua filhinha na mão. A carta que a mãe de Prestes pede para a carcereira entregar a Olga avisando que a menina está bem é rasgada pela carcereira nazista maléfica (e ela não demonstra nenhum sentimento enquanto faz isso, nem mesmo o ódio que se esperaria num conto infantil).
Mas não são apenas os clichês e a pieguice que acabam com qualquer possibilidadede levar o filme a sério. Clichês e pieguice não acabam com filmes, como prova "A cor púrpura", de Spielberg, a história de duas irmãs separadas por um casamento forçado pelo pai mau, em que o marido arrumado para separá-las é mau e desleixado e a quer apenas para sexo e faxineira, e ainda assim é um dos filmes mais bonitos que já vi. Olga, entretanto, é mal filmado e feio, os ângulos escolhidos são sempre os piores e parece que a produção contava apenas com uma câmera para gravar todas as cenas e com o mau gosto do diretor de fotografia (se é que havia um).
Assistir a Olga acaba sendo divertido porque é possível brincar, durante o filme, de achar o maior número possível de clichês e pieguices, e a cada dez deles somados antes do companheiro de filme (e adversário de jogo) pode-se obrigá-lo a pagar alguma prenda. Nos quinze minutos de filme que assisti com minha alterego e namorada Sharon Stone, ela imitou uma galinha e um macaco e eu dancei como a Carmen Miranda. Mais uns dois minutos e a Sharon seria obrigada a plantar bananeira e dançar ula-ula com os pés.
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