18 julho, 2007

Livros Grandes e Trechos de Tradução

Comecei a ler Dom Quixote. Acontece que eu percebi que o número de livros realmente grossos que já li é tão pequeno que me envergonho um pouco de falar. Foram quatro: Crime e Castigo, Quem é John Galt, Os Miseráveis e O Jogo das Contas de Vidro. É díficil dizer qual é melhor, mas John Galt certamente é o pior.

Ainda não cheguei nem à metade do primeiro volume, mas já quero ler Tirant lo Blanc, por causa da crítica de Cervantes - algo como "o primeiro e melhor romance de cavalaria". As primeiras trinta páginas de D. Quixote são de crítica literária, é uma maravilha. E quando a gente lê - digo isso sabendo que sou piegas, mas é emoção de verdade que preenche meu coração até a borda, e lembrar do livro mais uma vez é jogar a gota que escorre pela lateral do copo - a gente percebe que estava em dívida com a literatura, e que ela jamais ficaria feliz conosco se não lêssemos. Ler D. Quixote é pedir desculpas pelos anos de atraso em suas leituras.

Mas na verdade eu não ia ler D. Quixote, ia ler Os Três Mosqueteiros. No começo, lá pela 18 ou 19, Dumas fala que alguém (não cheguei a conferir o nome, parei antes) parecia "um D. Quixote aos 18 anos". Aí larguei os Mosqueteiros e fui ler o D. Quixote. E ah, como me arrependeria de não ter feito isso. Já me arrependi de não ter feito muito antes, de ter lido D. Quixote antes de todos os livros de aventura que já li (não são muitos, admito, mas alguns, poucos e bons). É a mesma coisa que me deu quando li Moll Flanders e Robinson Crusoé e Cândido e Sua Alteza Real e As Mil e Uma Noites (de que só li o volume I, mas logo lerei o II), e mesmo Os Miseráveis e O Jogo das Contas de Vidro, que deixei pro final pra repetir bem tarde.

Ainda não li muito do D. Quixote, algo como 1/5 do volume I, mas já deu pra saber que poucos livros serão melhores que ele na minha vida. E deu pra perceber me meu medo dos livros grandes não tem justificativa. Agora tenho um planejamento de ler vários livros grandes, pra completar ao menos dez livros grandes lidos, por mediocridade de caráter, por vaidade e por soberba, mas principalmente por medo do que estou perdendo sem ler esses livros que, apesar de grandes, podem ser melhores que os muito pequenos. Na fila estão Os Três Mosqueteiros, Guerra e Paz, As Crônicas de Nárnia, Ulisses, A História, A Montanha Mágica, A Odisséia (em prosa), talvez O Senhor dos Anéis e, se alguém quiser me dar 85 reais ou o livro de Tirant lo Blanc em português, ele entra na minha lista. Só não me peçam pra ler em catalão.

P.s.: A leitura de D. Quixote será interrompida assim que eu tiver novamente em minhas mãos o Freddy and Fredericka, que Viviane me deu no meu aniversário, mas que, relapso, esqueci da última vez que fui visitar meus pais. Um trecho mal traduzido segue logo abaixo, pra quem chegou até aqui perceber como esse livro é bom. A cena é um diálogo, em que o Prícipe e a Princesa de Gales (Freddy e Fredericka) discutem o nome de sua residência real. Desculpem pela má tradução, mas vejam vocês: é de graça!

"Freddy, por que ela se chama Mupau?", Fredericka perguntou numa voz que apesar de sua linhagem aristocrática às vezes se aproximava de um dialeto de vendedora londrina refinada, que na sua juventude ela tinha pegado de sua babá favorita e depois durante sua breve e desastrosa carreira no teatro. Freddy achava que esses vestígios eram como papoulas vermelhas e brilhantes espalhadas por campos de ouro. A rainha não achava, enxergando-os não sob uma coloração surpreendente, mas como uma irritação constante.

- O homem que a construiu a chamou de Mupau, respondeu Freddy.

- Que tipo de nome é esse?

- Português.

- Não parece Português.

- Sim, parece. Mu e pau.

- Mas o que isso significa?

- Vaca Pênis.

- O que é um Vaca Pênis?

- Eu não sei. O que você acha que deve ser?

- O pênis de uma vaca?

- Sim.

- Mas, Freddy, vacas não têm pênis, têm?

- Não, não têm.

- Então por que ele chamou este lugar assim?

- Porque ele não queria que ninguém o achasse, e um pênis de vaca é inexistente.

- Se eu tivesse um nome como esse, eu mudaria.

- Eu também, embora não tenha mudado meu nome de Freddy Finney, mudei?

- Você teria mudado se ele fosse Freddy Pênis de Vaca.

- Discordo. De fato, eu mudaria meu nome para Freddy Pênis de Vaca.

- Mude você ou não, vamos mudar o nome da casa para algo diferente de Mupau.

- Eu estou em Mupau há quinze anos e nunca tive problema. Mupau é um nome esplêndido.

- Mas não vai ser engraçado quando a televisão nos visitar e disser, 'aqui estão o Príncipe e a Princesa de Gales em Mupau'?

- Não, porque nem a televisão nem ninguém vai jamais saber desse lugar.

- Mas é tão bonito. Devia estar nas revistas.

- Nunca nas revistas, Fredericka, nunca. Deve ser um segredo. Mas se você quer realmente mudar o nome, talvez possamos.

- É um começo.

- Sabe, quando eu comprei, eu queria chamá-la por algum outro nome, algo magnífico e nobre, algo de que, desde que eu era um menino, eu gostaria de chamar uma propriedade no campo.

- Nada como Mupau, espero.

- Nada, de forma alguma. Aliás, é o nome que deve pertencer ao mítico rinoceronte branco de Bechuanaland, que na verdade é real, embora ninguém acredite em mim. Ele sempre me fascinou, e não vejo porque não podemos usá-lo em vez de Mupau.

- Qual é o nome?

- Mohoohoo.

- Mohoohoo? Não mesmo.

- Sim, tão elegante, disse Freddy - Eu queria chamá-la de Ostrich-hurst, mas então eu percebi que esse era o nome de um dos retiros secretos do meu pai, no St. Mary Hoo. Mohoohoo é melhor, de qualquer forma, mais sofisticado.

- Por que não algo como... Cliveden ou Hampton Court?

- Esses nomes já foram tomados.

Agora, bem tensos, eles não estavam mais se tocando e tinham esquecido o cheiro das rosas. - Eu não posso viver num lugar chamado Mohoohoo - Fredericka declarou - É ridículo.

- Então vamos manter Mupau.

- Imagine isso na Vogue - ela disse - Eu ficaria tão constrangida.

- Você sobrevive ao contrangimento em consideração à casa do seu pai, que, caso você tenha esquecido, se chama Feta.

- O que há de errado com isso?

- É um queijo.

- É um queijo delicioso, Freddy. E Mupau é uma casa tão maravilhosa, por que chamá-la Mupau ou Mohoohoo? Que tal algo mais convencional?

- Como?

- Edam, ou Gorgonzola.

Por um instante, Freddy ficou emudecido. - Esses são queijos - ele disse.

- E?

- Você não pode chamar uma propriedade pelo nome de um queijo.

- Claro que pode - ela disse, como se falasse com uma criança - Por que não? Que tal Sapsago Hall ou Mussarela? Já sei: 'A princesa de Gales em sua propriedade, Camembert'.

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